2- A história esquecida na noite dos
tempos
Trem Rio Doce Rápido Vitória a Minas:
A história esquecida na noite dos tempos
Prezados
visitantes!
A realidade histórica com a qual entrareis em contato neste blog,
através de depoimentos e, principalmente, fotos reais e vídeos retratando-a,
conta com exatos 56 anos de uma fascinante história, marcada pelas mais
incríveis tradições, aventuras, retrato de um passado glorioso, ao qual
designei chamar de “a era de ouro” dos trens de passageiros neste país chamado
Brasil. Gerações a fio, que viveram grande parte de suas vidas a bordo de um
magnífico trem de passageiros, se emocionaram e foram verdadeiramente felizes
em seu interior, sendo que um dos filhos dessa época poética, sonhadora, vos
dirige essas palavras carregadas de profundos sentimentos.
Esta é uma história real, mas que por longos 30 anos, ficou no
anonimato, no esquecimento da própria história e mesmo da memória ferroviária.
Não fosse por um árduo trabalho, uma profunda dedicação marcada por incansáveis
pesquisas, diálogos com dedicados escritores sobre a história das ferrovias,
entre eles, o amigo José Emílio de Castro Horta Buzelin e o amigo João Bosco
Setti e muitos outros amigos, testemunhas vivas e oculares desta época,
coletando dados e registrando informações importantes, esta história estaria
certamente perdida na noite dos tempos, existindo apenas em livros, mas de
forma muito esparsa. Esta história é de fundamental importância e parte
integrante da história da Estrada de Ferro Vitória a Minas. Valendo-me da
sinceridade e franqueza, contudo, sem a intenção de ferir a sensibilidade das
pessoas, é incompreensível que se conheça a história dessa grande ferrovia, sem
conhecer a história de um de seus mais formidáveis e importantes trens de
passageiros ou, diria, seu mais importante trem de passageiros, que impulsionou
o progresso das cidades pelas quais passava e encantou gerações.
Pouquíssimas são as pessoas que conhecem algo a respeito do antigo Trem
Noturno Rio Doce da Estrada de Ferro Vitória a Minas - Companhia Vale do Rio
Doce.
O Noturno Rio Doce, também denominado “Rápido Vitória a Minas”, fora
formado no longínquo ano de 1954, quando a Companhia Vale do Rio Doce, que
controla a Estrada de Ferro Vitória a Minas desde 1942, em comemoração ao cinquentenário
desta última, comprou da Companhia Industrial Santa Matilde, uma frota de
carros de aço carbono para passageiros, para formar o famoso trem de
passageiros que ficou conhecido na história como “Rápido Vitória a Minas”.
A Cia. Industrial Santa Matilde, cuja matriz era na cidade de Petrópolis
– RJ, com duas filiais; uma em Três Rios – RJ e a outra em Conselheiro Lafaiete
- MG, a partir da década de 1950, fabricara material férreo, entre eles,
truques, engates e veículos ferroviários para diversas ferrovias no Brasil,
incluindo a Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima - RFFSA. O nome “Rápido
Vitória a Minas”, surgiu principalmente para contrastar com o antigo trem de
passageiros também da Vitória a Minas, o PNT-1 que, até então, era formado por
carros de madeira e locomotiva a vapor (Maria Fumaça) e que fazia, no máximo,
cerca de 35 km/h.
O Rápido Vitória a Minas, formado por locomotiva a diesel B-12 da
General Motors e carros de aço carbono Santa Matilde, chegava a fazer até 60 km/h,
daí o nome “Rápido”, em comparação com a Maria Fumaça, além do fato dele não
parar em estações muito pequenas como Flexal, Vasco Coutinho, Capitania,
Relógio, Timbuí, Maria Ortiz, dentre outras cidades de pequeno porte.
A viagem inaugural do Trem Rio Doce da EFVM, foi feita ainda com uma
locomotiva a vapor de fabricação americana, uma Teen Weeler da EFVM, no final
do ano de 1954. A era das locomotivas a vapor chegara ao fim, na história da
EFVM. Nos anos seguintes, o Trem Rio Doce passou a ser tracionado pela
locomotiva diesel B-12 na cores vinho levemente avermelhado e com faixas
platina num tom quase branco e o tradicional emblema da águia. Os carros de aço
carbono para passageiros, também nas cores vinho-avermelhado e com a faixa das
janelas em platina levemente prateado.
Até o ano de 1963, aproximadamente, o Trem Rio Doce era tracionado por
uma B12, mas a partir de meados dos anos 60, principalmente no início da década
de 70, ele passou a ser tracionado por uma locomotiva G-12 de fabricação
americana da General Motors, com um motor de 1350 HP.
A composição do Rápido Vitória a Minas era formada, inicialmente, por 1
locomotiva a diesel B-12, 1 carro bagagem-correio-chefe de trem, 6 carros de 2ª
classe, 1 carro restaurante e 5 carros de 1ª classe. É importante lembrar que a
história dos trens de passageiros da Vitória a Minas, tanto o antigo PNT-1,
quanto o Trem Rio Doce, necessariamente passa pela história da Estrada de Ferro
Central do Brasil – EFCB e posteriormente da Rede Ferroviária Federal Sociedade
Anônima - RFFSA, conforme veremos a partir de novas postagens. Ainda no tempo
do antigo trem de passageiros da Vitória a Minas, o PNT-1, aproximadamente pelo
ano de 1947, a Companhia Vale do Rio Doce firmou um acordo com a Central do Brasil
e alugou desta última, dois fantásticos carros dormitórios (leitos) de madeira,
que a partir de Governador Valadares - MG, para quem vinha de Vitória – ES eram
engatados na composição do Trem da Vitória a Minas, tanto no antigo com carros
de madeira e locomotiva a vapor e também depois, em 1954 quando surgiu o
Rápido.
Esta foi a época da famosa baldeação de passageiros na cidade mineira de
Nova Era - MG, antiga São José da Lagoa – MG, baldeação esta que teve início em
1938 aproximadamente e que durou aproximadamente até o ano de 1965. Quem
viajava de 2ª ou 1ª classe, de Vitória - ES até Belo Horizonte - MG, deveria
desembarcar em Nova Era - MG para embarcar no trem da Central, pois ali era o
ponto final da E. F. Vitória a Minas. Mas, quem comprava passagem para os
carros leito da Central, não precisavam desembarcar, pois vinham de 1ª classe
até Governador Valadares - MG e bastava esperar até que os dois leitos da
Central fossem engatados na composição do Vitória a Minas. Ao serem engatados
os dois leitos, os passageiros que haviam comprado passagem para os mesmos,
apenas passavam dos carros 1ª classe para os leitos, de dentro do trem mesmo.
No entanto, quem prosseguia na 2ª ou 1ª classes, tinha forçosamente que
desembarcar na estação ferroviária de Nova Era, atravessar a linha e embarcar
no trem da Central que estava aguardando do outro lado da linha.
Este era o Trem noturno da Central, o misterioso trem cujo prefixo era
NF-1 e NF-2 respectivamente. De Belo Horizonte a Nova Era assumia o prefixo
NF-1 e de Nova Era a Belo Horizonte, NF-2. A baldeação de passageiros perdurou
até o ano de 1965 aproximadamente, quando o meu avô Altamiro Santos, então
Presidente da Câmara Municipal de Vereadores da cidade de Aimorés - MG, em 1959
resolve escrever uma carta para o Excelentíssimo Sr. Presidente da República
Juscelino Kubitschek, endereçando cópia dessa carta ao Senador Sr.
Benedito Valadares, ao mesmo tempo em que escreve para os Presidentes da
Companhia Vale do Rio Doce e da Central do Brasil, respectivamente, a fim de
solucionar o problema da baldeação de passageiros em Nova Era - MG. O fato fora
registrado nos cartórios da Câmara Municipal do Vale do Rio Doce e, resolvida a
situação, a partir de 1965, o Rápido Vitória a Minas já vinha direto até Belo
Horizonte - MG sem que os passageiros precisassem desembarcar em Nova Era, no
desconforto da baldeação. Retrocedendo-se uns anos antes, no ano de 1957, a 16
de março, sob Lei Federal nº 3115, é fundada a Rede Ferroviária Federal
Sociedade Anônima – RFFSA. Um novo convênio é firmado, desta vez, entre a RFFSA
e a CVRD - Companhia Vale do Rio Doce, a partir de 1965, aproximadamente. A
RFFSA assumiu toda a malha ferroviária e patrimônio da Central do Brasil, uma
vez que encampara esta última. Ao final da década de 1960 e início da década de
1970, a composição de passageiros do Rápido Vitória a Minas era novamente
servida com dois carros dormitórios, mas dessa vez, os de aço carbono da
RFFSA-6ª Divisão Central, depois RFFSA-14ª Divisão Centro-Norte e, depois ainda,
RFFSA - Regional Belo Horizonte, porém, no mesmo esquema, embarcando-se nos
mesmos em Governador Valadares – MG, para quem vinha de Vitória, ou então,
embarcando-se nos mesmos em Belo Horizonte até Governador Valadares, onde eram
desengatados da composição.
Foi aproximadamente por volta de 1960 que a frota de carros de aço
carbono Santa Matilde fora dividida, passando a formar 4 composições do Trem
Rio Doce, entre Vitória – ES e Nova Era – MG, sendo que em Nova Era, uma
prosseguia com destino à Belo Horizonte e outra prosseguia com destino à
Itabira. No sentido contrário, uma composição partia de Belo Horizonte - MG às
22:00h e chegava à Vitória - ES, por volta das 15:58h; a outra, saia de Vitória
por volta das 14:30h e chegava à Belo Horizonte - MG por volta das 07:20h. Este
era o Noturno Rio Doce, cujo prefixo era NF-31, de Belo Horizonte à Nova Era e
mudava-se o prefixo para RD-2 (Rápido 2), de Nova Era à Vitória. De Vitória
para Belo Horizonte, assumia o prefixo RD-1 (Rápido 1) e, ao chegar à Nova Era,
assumia o prefixo de Noturno NF-32.
As outras duas composições saiam; uma de Vitória - ES por volta das
07h20minh, passava em Aimorés - MG às 11h00minh e chegava a Itabira - MG por
volta das 18h50minh ou 19h00minh. Este era o Expresso, diurno, cujo prefixo era
P-1. A outra, devia sair de Itabira por volta das 08:00h, passava por Aimorés -
MG às 17:50h e chegava à Vitória por volta das 20:00h. Este era o outro
Expresso, o de prefixo P-2.
Na medida em que novas postagens forem sendo realizadas, muitos detalhes
serão, aos poucos, desvendados. Faz-se necessário, no entanto, lembrar que a
verdade histórica depende muito da época na qual fora vivida e dos fatos que
ocorreram nesta época. Por exemplo, os horários dos trens de passageiros da E. F.
Vitória a Minas mudavam constantemente, devido a inúmeros fatores como, por
exemplo, a conclusão da duplicação da Linha Tronco da EFVM em 1979, a mudança
no traçado da linha, dentre outros.
Entretanto, prezado (a) leitor (a), é preciso lembrar que a
história parece nunca terminar, pois a cada dia novas descobertas são feitas e
as descobertas mais antigas precisam ser atualizadas, complementadas ou mesmo
mudadas, a partir do momento em que novas informações vão surgindo. Para a
minha grande surpresa, descobri recentemente que, na realidade, o trem de
passageiros NF-31 e NF-32 respectivamente, era o próprio Trem Rio Doce da E. F.
Vitória a Minas. O que acontecia era que, de Belo Horizonte à Nova Era, o Trem
Rio Doce assumia o prefixo NF-31 e, de Nova Era à Vitória – ES, assumia o
prefixo RD-2 (Rápido 2). De Vitória – ES à Nova Era – MG, assumia o prefixo RD-1
(Rápido 1), mas ao chegar à Nova Era – MG, assumia o prefixo NF-32, porque o
ramal de Nova Era pertencia à Central do Brasil. O prefixo N = Noturno; F =
referente ao ramal de Nova Era e 31 e 32, referentes ao Terceiro Distrito da E.
F. Central do Brasil e também referente aos números dos trens, segundo
preciosas informações de Paulo Roberto de Oliveira Cerezzo, da General Elétric
em Contagem – MG.
No entanto, vale lembrar que os trens NF-31 e NF-32 e posteriormente ROB-1
e ROB-2 eram absolutamente os mesmos trens, ou seja, eram os dois trens da E. F.
Vitória a Minas com carros da EFCB e posteriormente, da RFFSA, no caso dos
ROB-1 e ROB-2. Tudo depende da época. De 1965 à 1976 eram o NF-31 e NF-32; de
1976 à 1983 eram o ROB-1 e ROB-2. Os trens cujos prefixos eram NF-31 e NF-32
respectivamente, eram formados por carros de aço carbono da E. F. Vitória a
Minas e carros de aço carbono da Central e em seguida, RFFSA-6ª Divisão Central
(a partir de 1971). Já os mesmos trens com os prefixos ROB-1 e ROB-2 eram
formados por carros da E. F. Vitória a Minas e carros da RFFSA - Regional Belo
Horizonte - SR2.
As viagens noturnas eram verdadeiras aventuras, marcadas pelos sonhos
dourados de uma criança enlevada pela aventura, embalada pelo apito do Trem
Noturno, nas noites alegres e inesquecíveis, poéticas, que ficaram na memória
para sempre, perdidas no tempo e esquecidas da memória ferroviária e de nossa
desmemoriada sociedade brasileira, mas bastante vivas na memória daqueles que
viveram suas aventuras, suas emoções, suas histórias de vida junto de suas
famílias e foram verdadeiramente felizes no interior de um trem magnífico, o
trem dos sonhos, um trem que o tempo levou e que não volta nunca mais…
Hélio Santos Pessoa
29/11/2010